domingo, 8 de novembro de 2009

Apenas pra falar da tristeza

Não estou bem. Lembro-me daquele momento no qual ainda era um bebezinho saindo da barriga da minha mãe. Fofinho, gordinho. Uma graça de criança. E aquele neném foi crescendo. Tornou-se um adulto com todos aqueles problemas conhecidos. E o adulto carrega dentro dele aquela criança que um dia foi. Um bebê que adorava sorrir, mesmo com a ausência de dentinhos. Quando chorava, era por fome, por dor física. Nunca o choro estava ligado ao emocional. Isso pelo menos até os oito anos, quando começou a sentir o coraçãozinho palpitar pelas pessoas que o cercavam. Agora grande, esse ser humano sente a necessidade de amor. Precisa dos outros. Não consegue viver sem ter em volta pessoas que gostem dele. No entanto, a vida teima em fazê-lo sofrer...

Ainda me lembro de quando tinha 10 anos. Apaixonei-me por uma menina. Um dia a tal mocinha apareceu na sala com o braço na tipóia. Fiquei com tanta pena, tanta. Sabe o que fiz? Cheguei em casa, após a aula, fui até a janela, levantei-a e a derrubei no meu braço... Não consegui me machucar da forma como queria. Contudo, falei para minha mãe que havia fraturado o braço. Eu queria acreditar naquilo. Não deu muito certo, pois o raio x acusou que estava tudo ok comigo.

Essa foi minha primeira decepçaõ amorosa. Não pude mostrar para meu amorzinho platônico que eu sabia a dor que ela sentia.

E tem sido assim. Hoje, com 25 anos, as coisas ainda continuam as mesmas para mim. Não há comunicação entre eu e as mulheres. Um campo de força invisível separa-me delas, impedindo-me de ser feliz, consequentemente.

Deus sabe quantas vezes chorei por uma mulher. Não tenho vergonha de derramar lágrimas. Foram muitas paixões recheadas de decepção. Projeções de felicidade que se desbotaram, ficaram foscas e sumiram. O colorido onírico sempre se transforma num preto e branco tenebroso.

E foram tantas vezes. Tentativas frustradas. Falsas tentativas... Eu sempre as quero e elas não me querem. Apaixono-me com tanta facilidade. Basta dizer que me acha legal e logo vejo a pessoa com outros olhos. No fim do dia sempre sobra meu quarto e eu mesmo preso nele. Minha prisão cotidiana. E a pior de todas, pois é em liberdade. Fico aqui sozinho lamentando. Fico também imaginando como seria uma vida mais feliz. E essa vida idealizada sempre está relacionada com a menina dos meus sonhos. A princesa encantada que me fará o cara mais feliz de todo o Universo. A criança dentro de mim sente necessidade dessa projeção. Ela quer se amamentar na felicidade. Se deliciar nos seios da esperança.

E ela olha para as moças nas ruas e vê a possibilidade. Porém, as moças das ruas não enxergam a criança. E ela chora. Em prantos clama por consolo. Este sempre vem, de algum lado. O choro passa, nem que seja depois de criar um riacho.

A criança olha as estrelas, olha o Sol, a Lua, o oceano. Tudo é cenário romântico. Ela se vê retratada naquelas pinturas famosas, como se o dedo de Deus a tivesse desenhado em cenas perfeitas. No entanto, logo tudo se desfaz e retorna a solidão. E mais tentativas frustradas. Ela implora para as moças: me ame! Por favor, me ame!

E as moças passam velozmente pelas ruas da nostalgia irreal. Não se dão ao trabalho de pegar o neném no colo ou mirar naqueles olhinhos brilhantes. E ele fica ali, chorando e se derretendo. Parece que o bebê é feito de açucar pra se derreter assim. E se afoga no Oceano da amargura. Sente-se sufocando quase até a morte. É uma sensação de querer gritar sem poder. É um grito interno que parece ser disparado quase como uma bala; vai ricocheteando nos órgãos e acelera o coração. E começa a disputa entre cérebro e coração. Os dois a iniciam na balança...Forma-se aquele equilíbrio inconstante. Após um tempo, cérebro e coração passam a disputar através do cabo-de-guerra. Puxam para um lado e para o outro. No fim, acabam fazendo algum tipo de acordo, quase sempre após a corda arrebentar.

Só que uma coisa é certa: a tristeza sempre prevalece. Pois a criança nunca pára de chorar!

E aquele sentimento engloba-se no adulto, quase como uma simbiose. Ele passa também a chorar. Novamente encontra-se no seu quarto aos prantos. Outra moça o deixou assim. O rapaz olha no espelho e se pergunta: o que tenho de tão errado? Fica tentando descobrir o que tem na sua personalidade que afasta tanto as pessoas, principalmente as meninas. Ele não sabe. Com certeza deve ser algo muito grave e imperceptível. Ou pode não ser nada; quem sabe apenas destino. Quando se percebe destinado a sofrer eternamente por amor, o adulto, (ou melhor, eu), fica tão triste quanto a criança. E as lágrimas retornam. Ele vai até o banheiro e as enxuga. Mas elas não cessam. O jeito é entregar-se a elas. Deitar e esperar que tudo aquilo passe.

- Oi, eu sou legal! Diz ele. As moças parecem não acreditar.
- Só quero te abraçar, beijar, fazer carinho e morrer abraçado contigo! Pensa, mas a moça o ignora.

- Vamos ter filhos, uma família feliz. Cozinho pra você! Limpo a casa, passo, lavo roupa, faço compras! Ele ainda insiste, mas percebe-se sozinho, numa sala vazia, falando com as paredes.

Avista a primeira que aparece, após horas de espera na rua das ilusões perdidas. Aproxima-se dela e se ajoelha. Implora uma chance. A moça o empurra, fazendo-o chegar ao chão. E ela desaparece. Ele fica arrasado. No chão, mais lágrimas o afogam. No entanto, não morre. Não consegue acabar com o sofrimento dessa maneira. O afogamento é permanente! Ele se zanga. Bate a cabeça nas paredes da sala vazia! Sangra, chora mais, sente o coração pulsando forte. Os dentes estão cerrados. Puxa os cabelos e os arranca gritando internamente. A voz não sai. Quando sai, é tão baixa que ninguém consegue ouvir. A respiração não vem. Continua aquele sufocamente. Ele aperta sua própria garganta, mas não surte efeito nenhum.

E olha em volta e vê vários casais felizes. Muitos beijos estalados. Pessoas fazendo amor nos corredores dos prédios. Nos elevadores. Casais na roda gigante. Maçãs do amor, algodão doce e beijos. Balões. Festas. Ônibus lutados de moças e rapazes que se amassam. Hotéis, motéis, carros lotados de casais apaixonados. Estão todos dispostos em fila, marchando contra ele. Está só no campo de batalha. Apesar de ser um exército de um homem só, nunca se vence uma guerra lutando sozinho... Todos aqueles casais apontam suas armas. O rapaz só tem uma lança para se defender, e ainda está quebrada. Antes dos tiros chegarem, perfura seu próprio peito. Mais uma tentativa frustrada de acabar com seu sofrimento. Quando vê, está novamente no seu quarto.
Agora percebe que está de frente para o computador relatando tudo isso no seu blog. Com os olhos cheios de lágrimas, pede socorro. E as lágrimas escorrem e chegam nos seus dedos. Atravessam a tela do laptop e atingem o texto em si. E surge um epitáfio:

Aquele que sempre quis amar mas que nunca foi amado. Lê.

No fim do post, ainda deixa mais um pedido, o qual foi escrito em conjunto com a criança dentro dele:

Por favor, me ame. E se não se importar com isso, que pelo menos não me faça sofrer mais do que já sofri.

Se sentiu algo com esse texto, que as palavras aqui descritas façam com que reflita sobre suas atitudes na vida. E nunca perca as oportunidades que lhe surgirem.

Aconteça o que acontecer, nunca deixe de amar a si mesmo e as pessoas que o cercam.

Eu cometi o erro de não me amar o suficiente. E talvez por isso ninguém ainda me ame do jeito que eu gostaria.

Peço perdão a você por isso.

Com amor,

Lê.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

O Boy: resposta à dama da noite

Olho pra você sentada aí sozinha e me dá certa pena. Minha querida coroa cheia dos preconceitos e infeliz, você acha realmente que suas palavras me afetam? Tenho cabelo arrepiadinho, sou boy sim, tenho meu jeito até mesmo juvenil nas minhas atitudes... Isso não quer dizer nada! Não pode querer me eliminar da face da Terra por coisas tão fúteis. Por acaso me conhece? Sabe alguma coisa sobre minha trajetória de vida? Conheceu meus pais? Você, minha querida idosa, é peça de museu velho. Acha ainda que vai aparecer um Humphrey Bogard nesse lugar aqui? Olhe à sua volta e veja a nova juventude que está surgindo. Somos todos de cabelo arrepiadinho. Somos mais do que a geração coca-cola. Somos a geração Twitter, Facebook, Orkut, Myspace, Fotolog, MTV, Emocore, Balada, Tubão. No entanto, queremos a mesma coisa que você, minha querida senhora: queremos ser felizes. Acha que um cara como eu não tem capacidade de amar? Pois digo, já amei, amo, do meu jeito, é claro. E nem vou responder acerca dessa história de que eu quero é dar o meu cu. E se eu quisesse dar, qual o problema? Você não tem o direito de dizer aos outros quais são as opções sexuais permitidas para cada um. Chupar uma bucetinha? Já cansei de fazer. Ao contrário de você, não idolatro isso. Talvez você faça do sexo oral um ídolo por não tê-lo praticado ultimamente. Meus amigos gostam de brincar que pessoas como você estão cheias de teias de aranha nas partes íntimas.
Na verdade tenho pena de você com todo esse mau-humor, essa tpm ambulante. Minha cara dama, você é daquelas pessoas que vão no supermercado e ficam com a cara amarrada, reclamando dos preços, fazendo os repositores (boys como eu) carregarem caixas de leite e fardos de farinha; você os faz colocar no seu carrinho e aí diz um obrigado seco, como se o pobre coitado fosse um escravo ou alguém subalterno. Você é daquelas senhoras que entram no ônibus e ficam prestando atenção nas conversas das pessoas pra chegar em casa e contar para a vizinha "como essa geração está perdida". Enquanto eu me divirto com minha galera, você fica no seu apartamento alisando seu gato preto e esnobe. Ou dando ração para seu cachorrinho com cara de rato. Realmente, minha senhora, realmente sinto pena de você. Acredito que seja daquelas pessoas pessimistas, daquelas que olham para a luz do sol e reclamam do calor; ou reclamam da chuva; ou do frio. Você não se importaria de usar casaco de pele, com certeza! Pois quer ser a Ingrid Bergman! Apesar de ser vegetariana. Porque ser vegetariano é chique. Quando passa por alguém que considera suspeito na rua, você logo desvia de caminho. Tem medo das pessoas! Tem medo de viver!!! Guarda sua caixinha de jóias como se fosse a urna sagrada do Tutancâmon! Não, eu não quero suas pérolas, pode ficar tranquila. Nem ligo para essas jóias. Dou mais valor para meus piercings e para minhas tatuagens. Talvez para o meu cabelo arrepiadinho... Que tal jogar um video-game comigo? Agora eu comprei um Nintendo Wii. Ah, esqueci, você não gosta de tecnologia! Não suporta esse pessoal que perde horas na frente de algum aparelho eletrônico. Tudo bem, é só deixar de perder sua meia hora diária passando laquê no cabelo. Vamos lá, vai ser divertido, principalmente o boxe. Você sua e fica em forma. Putz, esqueci que você não gosta de suar! Não vai querer fazer alguma caminhada, acampar, escalar montanhas... Se fizer isso, vai quebrar o salto, a unha. Não, não vou deixar tal tragédia acontecer contigo. Afinal, nem a louça você lava, com medo de deixar as mãos enrrugadas. Porque as rugas se espalham pelo corpo. Olha os pés de galinha no seu rosto! Se você não ficasse tanto tempo fazendo cara de quem não gostou, talvez não as tivesse...E, além disso, você tem empregada. Os R$ 300,00 que paga todo mês para ela precisam ser bem utilizados. Pois tempo é dinheiro, e dinheiro é vida. Ademais, você precisa ir no teatro, na ópera. Precisa encontrar mais pessoas ilustres como você, com laquê no cabelo e vestidos cor-de-abóbora-com-purpurina. Purpurina! Você é uma purpurina ambulante. Agora achei a palavra certa para lhe definir. Já consigo imaginá-la nas festas de fim de ano, solitária no seu quarto, lembrando dos tempos em que era feliz. Guardou uma espumante especial para aquele dia. Talvez sua amiga de Brasília a venha visitar no Natal. Quem sabe aquela ceia ainda possa ter sentido, caso tenha alguém para apreciá-la com a sua pessoa. Se não for no Natal, pode ser no Ano Novo. No carnaval. Na páscoa. E tudo isso pode passar e você pode ainda continuar sozinha, esperando seu Humphrey Bogard aparecer na porta desse pub. Se ele não aparecer, não seja tímida, pois o boyzinho de cabelo arrepiadinho não vai ignorá-la, caso puxe papo com ele. O boy aqui tem bom coração e sente pena de você com sua solidão. Agora, no momento, minha senhora, vou deixá-la aí sentada e vou curtir a balada com minha galera; talvez dar uns catos na minha gata. Tomar meu tubão e postar tudo no orkut. Ah, sim, claro, relatarei isso tudo no Twitter. Aliás, você tem Twitter? Tá, ok, vou deixar de fazer essas perguntas bestas. Agora vou mesmo. E caso queira se matar, prefira afogamento. Porque gás é perigoso para as outras pessoas. E, se pular do prédio, você pode acabar caindo em cima de alguém. Isso tudo é muito arriscado. Faça igual aquela moça, aquela escritora ... como é o nome dela mesmo? Virgínia alguma coisa. Será até mais chique pra você morrer assim... E se tiver um derrame ou infarto, que seja aqui por perto. O boyzinho pode ligar para a ambulância ou até mesmo levá-la de carro ao hospital. Não deixaria de prestar socorro a ninguém, nem mesmo a você que é tão, tão...Tá, não vou mais ofendê-la. Não mais do que você fez a mim. E se a gente não se ver, uma boa noite! Seja feliz!

Boyzinho

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Olympos Bar

A neblina trazia-me certa paz. Meia noite era um horário que eu realmente gostava. Ouvi os sinos da Igreja e atravessei a praça. Virei na rua da esquerda. Era um declive. A placa luminosa do local chamava atenção: Olympos Bar.

Garçom - Boa noite!

Leandro - Boa noite! Desce um Highland Park, por favor!

Garçom - É pra já!

Fez sinal com o dedo indicador, perguntando se eu queria uma pedra de gelo. Balancei a cabeça e pisquei, confirmando.

Olhei em volta e do meu lado dois sujeitos conversavam. Não hesitei, abri meus ouvidos para escutar.

Sujeito do terno Preto - Pois é isso, não sei o que faço com o Gabriel!

Sujeito do terno Branco - Ele logo aceita o destino dele. (fez isso e saboreou seu vinho tinto uruguaio, provavelmente um Tannat).

Os dois perceberam que eu ouvia o papo e me cumprimentaram.

Sujeito do terno Preto e Sujeito do terno Branco - Boa noite!

Leandro - Boa noite!

Sujeito do terno Branco - Você é o Leandro, não é? É um exemplo de vida. Muita gente comenta sobre você.

Leandro - Como sabe?

Jesus - Pode me chamar de Jesus. O cordeiro de Deus, seu criador. Prazer!

Olhei um pouco espantado.

Lúcifer - E eu sou Lux, ou Lúcifer. O diabo, cramunhão, entre outros nomes populares. Meu pessoal também tem falado muito de você...

Leandro - Poxa, que honra encontrar vocês dois! O que me contam?

Jesus - Estava aqui pensando com o Lulu sobre nosso camarada Gabriel. Ele anda meio perturbado. Um dia se diz anjo do bem, no outro anjo do mal. Não sabe de qual lado quer ficar.

Lúcifer - Eu queria muito que ele ficasse do meu lado, mas o Gabi vive querendo praticar boas ações...

Leandro - Entendo. Mas todo mundo é assim, não? Todos estão divididos entre o bem e o mal.

Jesus - Isso é verdade! Principalmente com seres humanos. A gente que é celestial ainda tem noção das coisas, mas vocês estão sempre perdidos.

Nisso aparece na porta uma figura curiosa. Bigodão saliente, meia careca, olhos nervosos.

Lúcifer - Nietzsche!!

Nietzsche - Olá! Lulu, Emanuel! Quanto tempo!

Jesus - Pois é! A gente precisa botar o papo em dia. Como andam as coisas na nova dimensão?

Nietzsche - Perfeitas! Agora estou trabalhando na análise de textos filosóficos dos reptilianos. Voltaire tem me ajudado muito. O problema é aguentar a chatice do Rousseau, com seus dramas existenciais. Se não fosse o Diderot pra alegrar todo mundo, não sei o que seria do nosso grupo.

Lúcifer - Interessante... Eles deixaram saudade.

Nietzsche virou-se para mim

- Boa noite!

Leandro - Boa noite! Eu sou o Leandro.

Nietzsche - Ah, já ouvi falar de você! Como andam as coisas?

Leandro - As mesmas de sempre. Vivendo, enquanto houver vida que valha a pena.

Nietzsche - Sei como é! Já passei por essa fase. Você ainda é jovem, vai saber como enfrentar isso.

De repente apareceram mais três sujeitos. Sorriram e se aproximaram da gente.

Jesus - Marx, Maomé, Buda!

Marx - Olá senhores!

Maomé - Noite linda essa.

Buda - E não passaram da 1h da manhã ainda...

Fiquei apenas observando o papo daqueles ilustres senhores.

Jesus - Estamos aqui faz algum tempo falando abobrinha. E vocês, o que têm feito?

Marx - Eu e Engels temos trabalhado no departamento de anjos anticapitalistas. Recrutando voluntários e tal.

Lúcifer - Ah, eu sei! Eles vêm pra Terra de vez em quando. Dão trabalho pra mim...

Marx - Estou sabendo disso! hehe! Mas é nosso trabalho.

Lúcifer - Claro!

Buda - Eu tenho me reunido com Gandhi. A gente tá pensando em dar aula de interiorização para o povo da realidade alternativa.

Jesus - Hummmm... O legal de lá é que tudo é imprevisível, até pra mim!

Buda - Verdade!

Jesus - E você Maomé, como está?

Maomé - Tenho visitado alguns planetas na borda do Universo. Gosto de conhecer outras culturas. Meu cavalo adora fazer viagens longas... Voar rápido pra ele é um grande prazer.

Lúcifer - Alguém aqui sabe por onde anda Zeus?

Jesus - Você não ficou sabendo que ele tem criado outros planetas por aí?

Lúcifer - Não fiquei sabendo.

Jesus - É, ele adora bancar o arquiteto de universos.

Lúcifer - Zezé é uma figura.

Eu estava maravilhado com aquelas conversas. Nunca tinha sentado numa mesa com pessoas tão interessantes. Nisso, Nietzsche chamou o garçom. Ele se aproximou da mesa.

Nietzsche - Qual banda vai tocar hoje?

Garçom - É um trio muito especial. Vocês já ouviram falar do Nevermind the Sun?

Jesus - Adoro! Eles vão começar a tocar a que horas?

Garçom - Agora mesmo!

Olhei para o palco e vi se ajeitarem nele Kurt Cobain, John Lennon e Elvis Presley.

Aquela noite foi inesquecível. A neblina ficou ainda mais forte no resto da madrugada. Às cinco da manhã, me despedi do pessoal que estava na mesa, paguei a conta, arrumei meu casaco e saí.

Ao dobrar a rua, avistei um gato preto com olhos fumegantes. Olhei pra ele e sorri. Ele retribuiu o gesto. Continuei até o fim da rua e sumi na neblina.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Sobre Vampiros e vampiros: uma história real.

Cristine dormia tranquilamente. O céu estrelado e a Lua cheia tornavam aquela noite mais bela do que era de costume. O vento soprava timidamente. A penumbra era invadida pelo sutil brilho do cosmos.

Na janela surgiu uma sombra. Ficou estática, olhando para Cristine. Olhos avermelhados, intensos, de predador. Metacarpo aproximou-se da garota tão rápido quanto um flash de luz. Estava de pé ao lado da cama. Com as pontiagudas presas preparava-se para fazer mais uma vítima. Agora! Pensou...

Porém,

Cristine abriu os olhos e ele parou o movimento.


Cristine - Puta que pariu hein! Não se pode nem dormir sossegada mais!

Metacarpo - Agora já é tarde, é o seu fim. Prepare-se! (Ainda tentava inserir temor à vítima).

C - Ah, vai se foder! Não tenho medo de vampirinho não.

M- Como não? Eu posso esmagar seu corpo como se fosse um pacote de fandangos...

C- Pois faça, não tô nem aí!

M- Já não se fazem mais donzelas em perigo como antigamente...

C- A situação não tá fácil não meu camarada.

M- E por que você não tem medo de mim?

C- Não tenho mais medo da morte. Minha vida tá uma merda!

M- O que aconteceu com você?

C- O problema é minha mãe.

M- Como assim?

C- Ela estragou minha vida.

M- Pela minha experiência, na história da humanidade os progenitores têm auxiliado as proles na estrada da vida.

C- Pois a minha mãe não.

M- O que ela fez?

C- Tudo! Eu não sou a filha que ela queria.

M- Você parece ser uma menina legal, por que não agrada sua mãe?

C- Tá, vou contar minha história, isso se não te chatear...

M- Nada mais me chateia depois de dois mil e duzentos anos.

C- Putz, mas tu é velho mesmo hein! Tá bom então, vou contar. Eu trabalhava numa farmácia como atendente e ganhava super bem. O dinheiro me possibilitou sair de casa, meu sonho. O problema é que eu tinha outro sonho: me dedicar à música, minha paixão. Acreditava que um dia conseguiria realizar tal desejo. No entanto, eu trabalhava e morava sozinha. É aí que minha mãe entra na história. Ela não gostou nada desse lance de emancipação. Viúva como é, pois meu pai morreu quando eu ainda tinha um ano, sentia-se sozinha demais. Adoentou. Acredito eu que ela quis ficar assim só pra me ferrar! Pois bem, ela começou a me ligar. Dizia que sentia minha falta e que queria que eu voltasse a morar com ela. Todo o dia era a mesma coisa, ela ligava e me implorava. Então começou a me persuadir, falando que se eu voltasse a morar lá poderia largar meu emprego e pegar um mais light. Poderia inclusive entrar num conservatório de música para me dedicar ao meu sonho! Ela me conquistou com isso. Resultado: larguei o emprego e voltei a morar aqui com ela. Não deu um mês e a coisa se modificou. Ela passou a me cobrar: Menina, você só fica o dia inteiro no computador! Arranje um emprego! Não demorou muito para ela me chamar de vagabunda: fica aí vadiando o dia inteiro! E ainda por cima perde tempo tocando violão! Por que não vai fazer algo que preste! ...

M- Realmente, triste sua história...

C- O pior é que ela não me aceita como sou! Eu sou lésbica, fumo, bebo, saio à noite...

M- Hummm, sei...Sua mãe é mais vampira do que eu.

C- Ela cuida de uma lavanderia, por isso fica boa parte do tempo fora de casa. Só que quando ela chega eu venho aqui para o quarto. A gente não aguenta olhar uma para a cara da outra!

M- Que lástima!

C- Quero muito sair daqui. Voltar a me emancipar. Quero conquistar tudo de novo através da música.

M- Você conseguirá, se acreditar nisso.

C- Eu sei.

M- Você realmente quer que a sua situação mude?

C- Sim, faria qualquer coisa...

M- Pois espere um minuto...

(Metacarpo foi para o interior da casa numa velocidade espantosa. Voltou com a mãe de Cristine pendurada em seus braços)

C- Oh!

M- Aqui está! Como estou com fome, vou ao mesmo tempo me saciar e ajudá-la.

Mãe de Cristine - Oh meu Deus! Sua vagabunda, eu sabia que você aprontaria pra cima de mim! Só faltava isso, contratar alguém pra acabar comigo!

C- Eu não o contratei mãe. Ele invadiu nossa casa.

M- Cristine, espero que agora você consiga cumprir com seus objetivos na vida.

C- O que você vai fazer com ela?

M- Você sabe...

Mãe de Cristine - O que eu fiz pra merecer isso?!!!

C- Você fez muita coisa!

M- Adeus Cristine! Nunca mais nos veremos.

C- Adeus! Obrigada!

M- Obrigado digo eu...

Metacarpo saiu pela janela com a mãe de Cristine nos braços, segurando-a como se fosse um pacote de supermercado. A mulher ainda gritou para a filha:

- Sua vagabunda!!!

C- Sim, mãe, vagabunda. Porém realizada...

Cristine voltou a dormir tranquilamente naquela bela noite.

Longe dali, Metacarpo olhava para o seu jantar.

Mãe de Cristine - Seu filho da puta!

Metacarpo - Aceite o seu fim!

Mãe de Cristine - Nnnnnnnnnnnnnããããããoooooooooooo!

O vampiro sugou todo a sangue daquela senhora e se saciou pelo menos por aquela noite. Muitas outras noites ainda viriam pela frente. Só que uma coisa é certa: Metacarpo sentia-se bem por ter ajudado alguém. Fazia dois mil e duzentos anos que não sentia mais traços de humanidade em si mesmo.


O Sol apareceu e iluminou o rosto de Cristine. A garota deu um sorriso e pensou: esse é o primeiro dia de uma nova vida.


quinta-feira, 2 de julho de 2009

Ouija Shakespeariano

Pompeu
Penélope
Astrogildo

(3 amigos sentados no chão brincando com um tabuleiro Ouija)

Pompeu - Penélope caríssima, dama de longas tranças, podes fazer de mim o primeiro a jogar em tão fabuloso tabuleiro?

Penélope - Claro amicíssimo meu, todo seu és o tabuleiro. Algo contra Astro?

Astrogildo - Não quero constranger a vontade de meu querido Pompeu.

Pompeu - Devo lhes agradecer fiéis amigos. Tabuleiro que aqui estás, pergunto-lhe se neste local existe alguma alma que queira conosco se comunicar? E que Jesus, nosso Senhor, nos proteja daquelas que se atrevam a querer-nos fazer algum mal. Sabemos que o dia do juizo logo chegará, assim como o filho de Deus nos afirmou. Portanto, Ouija, aja!

Penélope - Nada acontece. Precisamos fazer alguma prece?

Astrogildo - O céu e o mar são testemunhas do que vou lhes dizer: Meu pai disse-me uma vez que esses jogos servem somente para assustar os tolos. Juro por Davi que eu já sabia o que aconteceria.

Pompeu - És realmente muito sagaz! Deveria nos ter alertado com antecedência, meu nobre!

Astrogildo - Seria acabar com suas vigorosas expectativas.

Penélope - Meus queridos, não estou bem!

Pompeu - O que tens?

Penélope - Calafrios...

Astrogildo - Não fico à vontade nessas situações.

Penélope - Acho que vou desm... (desfalece)

Pompeu - Traga ajuda, anda! Ficarei com nossa amiga.

Astrogildo - Logo retorno com um médico!

Pompeu - Espero que não seja tarde demais...

(Alguns segundos depois)

Pompeu - Essa linda dama que agora se apresenta desfalecida nos meus braços é tão doce e pura quanto o néctar de uma rosa existente no paraíso. Como queria ter esse amor. Esses olhinhos fechados! Parece estar implorando por carinho a minha querida Penélope. Longas mechas douradas que parecem com o ouro celestial das harpas tocadas pelos anjos. Ei-la. Eis-me aqui a apreciar tão rara beleza. Poderia beijá-la agora, claro! Não, não seria certo sem seu consentimento! Aproveitar-me de tal situação seria algo vergonhoso para um gentil moço como eu. Que as ninfas me flagelem por pensar em tal qualidade de coisa. O que, estás por despertar! Devo cessar meus pensamentos caluniosos.

Penélope - Pompeu! Apaguei completamente. Não sei o que houve.

Pompeu - Fique calma criança. Logo Astro retornará com um doutor!

Penélope - Talvez não seja necessário, estou melhor.

Pompeu - Nunca se sabe o que pode acontecer...

Penélope - Tens razão.

Pompeu - Podes continuar aconchegada nos meus braços enquanto isso.

Penélope - Não cheguei a pensar o contrário. És realmente um cavalheiro Pompeu!

Pompeu - Nada que outro moço bem apessoado não fizesse diante de tão delicada situação.

(Astrogildo retorna com o Médico)

Astrogildo - Vejo que ainda cheguei a tempo de salvá-la!

Médico - Parece-me que a situação não é tão grave como pensava. A rapariga retomou os sentidos.

Pompeu - Graças ao nosso Rei maior!

Médico - No entanto, pelo que posso observar, ela sofre de algo que não tem cura.

Penélope - Como assim ?

Médico - Primeiro preciso que Pompeu se deite, pois vou examiná-lo antes.

Pompeu - Não compreendo...

Médico - Anda! Ousas desafiar a ciência? Por Pitágoras! Não peço grande coisa a ti para fazer tal escânda-lo! Nossa juventude não é mais a mesma, a tudo questiona os mais experientes!

Pompeu - Deitado estou! Não precisa mais esbravejar!

Médico - Deixe-me ver... Sim, como pensava! Também não tem cura!

Pompeu - Oh não! É algo muito grave? Terei de avisar meus pais...Espero que meu irmão mais novo honre a família após receber toda a herança no meu lugar. Assim mesmo obra a fortuna em nosso caminho, não importa quão virtuosos sejamos! Longe no horizonte posso sentir minha alma se esvaindo no Vale das Almas. Orgulho-me de ter sido fiél aos meus princípios toda a minha vida! Anjo da morte, estou pronto para enfrentar o que para mim está destinado...

Médico - Agora preciso examinar a rapariga.

Penélope - Faça o que tens de fazer.

Astrogildo - A angústia tomou conta do meu coração...

Médico - Sofre do mesmo mal que Pompeu! É incurável! No entanto, acredito que ambos podem se ajudar.

Pompeu - Como, astuto senhor?

Médico - Sejam sinceros uns com os outros!

Astrogildo - Como?

Pompeu - Hein?

Penélpe - Hã?

Médico - Examinei a ambos e cheguei a uma conclusão. Estão apaixonados! Seus corações não mentem! Nunca apreciei órgãos com tanta vitalidade. No momento em que cheguei e os vi naquela cena digna de qualquer fábula de amor, fiquei sem vontade de interromper. Assim sendo, digo-vos: sejam felizes! E adeus!

Astrogildo - Espere senhor, vou acompanhá-lo! Quero deixá-los a sós para resolverem tal questão!

Médico - Sábia atitude, jovem!

(Saem)

Pompeu - Estás enrubescida...

Penélope - Não sou a única.

Pompeu - Queria lhe dizer que és perfeita!

Penélope - Pois digo-lhe o mesmo meu querido.

Pompeu - Faz anos que escondo meus sentimentos. Medo de perder sua amizade!

Penélope - Repito: digo-lhe o mesmo! Somos dois tolos!

Pompeu - Somos jovens!

Penélope - Estás certo.

Pompeu - Sinto-me como se estivesse flutuando por entre as ondas sísmicas. Meu coração bate forte agora ao seu lado, querendo saltar à boca! Como sonhei tantas vezes com esse momento, no qual saberias que te amo.

Penélope - A felicidade bateu também à minha porta. Nada poderia ser mais belo do que isso que agora vivenciamos.

Pompeu - Beijar-te deve ser tão refrescante quanto nadar nas lagoas do Éden.

Penélope - Então por que não experimentas saciar-se nessas lagoas?

Pompeu - O que me pedes há de receber...

Penélope - Com todo meu consentimento...

Tabuleiro Ouija (escrevendo sem que os dois enamorados percebessem) - A M O R.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

A PLUMA E A PUMA

Achei alguns textos meus antigos perdidos no meu computador velho. Esse é um deles.


Olha que bela a pluma,
Girando no cata-vento!
Como com sangue afoga,
Bebe o próprio tormento.
Olha que bela a pluma,
Voe voe mas não suma.


Gire e gire na roda,
Saia deste sofrimento!
Veja, vomite a droga.
Perde-se a pluma no vento,
Unta a vida na fossa,
e tenta agarrar o tempo.

Olha que velha a puma!
Mais rápida que o vento!
Corre, alcança a pluma
Na liberdade da bruma,
Derruba o cata-vento.

Olha que bela a puma!
Gira agora o vento,
Livre do sangue, da droga
Puma na pluma afoga,
O próprio passar do tempo.